(São
Gonçalo do Rio Abaixo / Itabira)
No
final de novembro passado, a prefeitura de São Gonçalo anunciou,
por meio da sua assessoria de comunicação social, as construções
de duas Estações de Tratamento de Esgoto (ETE), sendo uma na sede
do município e outra no Una, que é a maior comunidade rural de São
Gonçalo.
Juntas, elas custarão mais de 9 milhões de reais e deverão ser concluídas
em cerca de 1 ano, promete o pessoal da prefeitura. Sem dúvida que
poderá ser uma boa notícia para as futuras recuperações dos rios
Santa Bárbara e Una (afluentes do rio Piracicaba, componentes da
bacia do rio Doce), mas depende de umas questões técnicas a serem
esclarecidas para a população.
Chamou-me
a atenção, ainda, três fatos: o uso repetido (3 vezes) do adjetivo
"grande" constantes na lacônica nota oficial, o curto
prazo para execução da obra (vistos que não têm cumprido bem) e o
fato de abrirem ordem de serviço a um mês do término do mandato.
GRANDES
PASSOS?
Com
relação ao uso recorrente do adjetivo "grande" no
press-release (texto enviado por instituições para tentarem
a veiculação gratuita na imprensa), o pessoal da comunicação não
poupou na franca bajulação, quando parodiou a épica frase de Neil
Armstrong, dita após colocar os pés pela primeira vez sobre a
superfície lunar: "as duas ETE’s...blablablá... além de ser
um grande passo para a preservação (nota do autor: não seria recuperação?) do meio ambiente" (clique aqui para ler a matéria original).
Picuinhas
ou bromas à parte, temos que endossar que pode até se tratar de um
passo significativo, mas que a garantia de eficiência depende de como estão as redes de esgotos e pluviais nos âmbitos dessas futuras Etes, caso elas
sejam dos tipos convencionais*, capazes de alcançar uma eficiência de até 90% de tratamento.
Como
documentarista, já fiz um vídeo sobre uma das maiores da região, a
Ete Laboriax de Itabira, que inclusive foi alvo de investigação da
Polícia Federal, por suspeitas de desvio de dinheiro público (um caso à parte, é claro).
A
ineficiência da Ete Laboriaux começa quando chega o período das
águas e o volume de efluentes, somado às águas das chuvas que
foram lançadas indevidamente nos emissários de esgoto, aumenta de
uma maneira tal que o sistema não dá conta de tratar, fazendo com
que a central desvie boa parte do volume direto no leito do rio do
Peixe, sem qualquer tratamento (operação também conhecida por by pass).
Será que em São Gonçalo do Rio Abaixo elas estão de acordo
e devidamente aptas? Esta pergunta (e outras) foram feitas por e-mail
para o pessoal da comunicação, com cópia para a Secretaria de
Obras, às 7:09 da manhã do dia 04 (antes de ontem) e, até o
fechamento desta publicação, não tivemos resposta. Aí, meus caros, vá saber se só chegarão efluentes de esgotos domésticos (com matéria orgânica) nestas futuras Etes a serem construídas...
Daí,
questiono é o fato da mídia reverberar a futura "grande"
obra sem qualquer análise ou questionamento. O que tenho visto pelo
país afora é um oba-oba danado. A Ete Laboriaux é que o diga,
porque não tem funcionado adequadamente, segundo informações de
fontes confiáveis. Mais do que ter sido uma propaganda enganosa, temos aí
milhões de reais investidos de forma mal planejada. O melhor seria
corrigirem todas as redes antes, para depois construir a Ete, que
gera custos de manutenção com folhas de pagamento, energia e insumos, a
partir do momento que entra em operação. Construir uma Ete antes da rede necessária é o mesmo efeito de colocarmos
perfume em chulé ou cecê. Funciona?
Para
quem duvidar, lanço o desafio:
-Topa
tomar um copo d'água na saída de uma Ete?
UM
ANO MESMO?
Outra
questão levantada nesta postagem é com relação ao curto prazo de
execução para as duas Etes. Será mesmo que conseguirão inaugurar
tamanhas obras em tão curto tempo?
Só
lembrando, no dia 16 de fevereiro de 2011, com muita pompa, foi
anunciado o tal pacotão dos 64 milhões de reais em obras (clique aqui para confirmar), que têm corrido em ritmo tão lento que não
conseguirão entregar até o final deste governo.
Como
gato escaldado tem medo de água fria, fico com a cisma, mas torcendo
para que o próximo prefeito a ser diplomado consiga concluir.
POR
QUE AGORA?
Se
por um lado soa bem o fato do prefeito assinar ordens de serviço de
obras que sejam do interesse da população e que no futuro poderão
ser para o bem do meio ambiente, estranho o fato de assinar agora, a
um mês do fechamento do seu mandato.
O
que antevejo é que o brilho do futuro prefeito ficará esmaecido a
favor do criador ou pai da ideia, para entregar o governo com o
crédito da obra, deixando para seu sucessor a responsabilidade do todo o trabalho da construção e operacionalização, ou seja, de colocar as mãos na massa (sem qualquer alusão ao lodo orgânico... arghhh).
E
mais... e se a assessoria técnica do sucessor vier a entender que o
melhor é corrigir as redes de efluentes primeiro, para evitar o
desembolso antecipado de milhões de reais no tratamento de efluentes
misturados, caso seja essa a situação de São Gonçalo?
MORAL DA ESTÓRIA
Então, volto à comparação que vi com "o primeiro grande passo do homem na lua", com a frase pronta "grande passo para a preservação do meio ambiente".
Passados 43 anos, quase meio século depois, qual foi a vantagem concreta do governo norte-americano ter torrado na época US$ 25,4 bilhões (quase US$ 100 bilhões atualizados), a não ser lucro político para melhorar a imagem do governo John F. Kennedy? Vocês podem até alegar que precisamos das missões espaciais para tentar encontrar outro planeta habitável, depois que esgotarmos todos os recursos do planeta Terra, assolado e sugado à exaustão pela raça humana. Mas seria esta, bem mais difícil e onerosa missão, melhor do que fazermos já os deveres de casa, ao cuidar e zelar do planeta que fomos criados?
De igual forma, não é que a comunicação oficial, acredito que sem querer e por coincidência, nos ofereceu de bandeja a mesma possibilidade de reflexão? Por que os municípios devem investir milhões de reais em ineficientes tratamentos de esgotos, se as redes ocultas, enterradas debaixo das ruas, não estiverem adequadas? Seria mais um reforço ou tentativa de recuperação de imagem?
* O pipeline
da Ete Laboriaux começa por uma grade retentora de lixo; passa por
um tanque desarenador (separa a areia do esgoto); por um reator
anaeróbio; depois o lodo resultante é prensado, o gás é queimado ou engarrafado; o efluente passa por filtros percoladores e, por último, segue para as lagoas de
maturação, onde os raios ultravioletas eliminam boa parte das
bactérias e vírus. É um tipo de planta de tratamento que pode atingir até
90% de eficiência.
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