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segunda-feira, 10 de maio de 2010

MINÉRIOS E SILVÉRIOS

As Minas eram gerais. Foi primeiro o ouro. Depois, o diamante, incalculáveis tesouros. Portugal sabia que tudo valia. Cobrou e Minas pagou, grama por grama, oitava por oitava, quilate por quilate. Bancou, com sua pobreza, a vida nababesca dos castelos, a revolução industrial inglesa. Fez a riqueza de fora, alimentou a pobreza aqui dentro. Hoje, muitos anos depois, Minas insite em manter a pobreza de sua gente, de sua natureza, de seu patrimônio histórico, cultural, arqueológico e espeleológico, o martírio das populações que vivem em suas áreas rurais, fazendo a riqueza das grandes corporações, das grandes multinacionais que exploram seu minério: as novas portugais. Tudo, por algumas moedas de ferro, sinais de uma mentalidade decadente e enferrujada, como se esta terra não fosse cenário de uma heróica inconfidência.
Ao que se constata em uma primeira análise, Minas deixa de arrecadar, anualmente, só com os royalties do minério, mais de R$3 bilhões. O que isso significa? Significa que as mineradoras vão extrair nosso minério, comer nossas serras, engolir nossas florestas e nos deixar apenas uma mísera gorjeta, um pequeno agrado, bem barato, frente ao patrimônio incalculável que elas nos levam, diariamente. Seus caminhões, cada vez maiores e mais pesados, estão destruindo as rodovias asfaltadas, formando verdadeiras valas em nossas vias. Nas estradas, o perigo iminente de acidentes por veículos longos transportando dezenas de toneladas de cargas.
O petróleo tem sua extração no mar, distante das populações que vivem no litoral. Sua extração não come serra, não destrói a história, não derruba árvore, não seca nascentes, não assoreia rios e, no entanto, paga 5% do valor bruto arrecadado ao estado produtor. Em Minas, a extração do minério deixa apenas 0,2% do valor líquido arrecadado. Em 2009, o Rio de Janeiro arrecadou R$10 bilhões advindos do petróleo. Minas, só R$65 milhões com o minério. Como classificar um disparate desses? Bom, por muito menos, outros mineiros fizeram uma histórica revolução e vidas, das mais nobres, foram ceifadas.
A poeira do minério é depositada. Minuto a minuto, nas fachadas de nossas casas, nos bancos de nossas praças e dentro dos pulmões dos mineiros que moram perto dos locais de mineração. Do Pico do Cauê, declamado por Drummond em poesia, só restou um monte de tristeza e pó. No infinito, o Pico do Itabirito assiste ao seu fantasma despido e desolado. Em algumas áreas de exploração, o mal maquiado, o feio escondido, guardado, envergonhado, pobre Serra do Curral. O que vamos ganhar por tudo isso? Menos que os índios primeiros, que deram o caminho, mas não entregaram o tesouro.
Por que essa vergonhosa realidade calada em nosso estado? Porque Minas aprendeu a entregar suas riquezas sem cobrar algo em troca. Foi assim com o ouro, foi assim com o diamante e está sendo assim com o minério de ferro. Se por um lado a doação de ouro e dos diamantes nos deu a nossa história, nossas igrejas, nosso casario e nossa cultura, por outro a doação do minério deixa apenas um buraco em nossas almas, em que sepultamos os nossos rios, nossas belezas e a certeza de que nossas vidas valem muito menos que as de outros.
(Petrônio Souza Gonçalves, jornalista e escritor, na edição de sábado do Estado de Minas)

Um comentário:

  1. Andei refletindo melhor sobre a briga dos royalties do petróleo serem divididos com os demais estados, sob a alegação de que as águas pertencem à União.

    De repente, ao invés de tentarmos inviabilizar o Rio de Janeiro e demais estados e cidades com a divisão deles, não seria mais oportuno corrigir essa defasagem?

    O Deputado Federal José Fernando Aparecido de Oliveira-PV andou batendo nisso, mas sua voz pouco reverberou. É um mote (e necessidade) e tanto. Só que, diante do desinteresse da grande mídia, fica patente que o domínio nacional é bem distante das reais necessidades.

    Em algumas postagens, andei abordando sobre o equívoco tributário ao cobrar muito do consumidor final, enquanto entregamos commodities, quase que de graça para o mundo. A gasolina brasileira é vendida no mercosul por muito menos do que compramos aqui, segundo informações distribuídas fartamente na internet.

    Por isso, minha tendência de andar na contra-mão da maioria. Que coisa, né?

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